quarta-feira, 25 de julho de 2012

Sempre conheci este poema como sendo do meu pai. Hoje, numa rápida busca encontrei-o com o nome de outro autor. Seja de um ou de outro para mim continua a ser uma obra prima, e recordo-me que o meu pai recitava-o com uma intensidade tal que chegávamos a pensar que o estudante era ele prórpio.

    O Estudante AlsacianoAntigamente, a escola era risonha e franca.
    Do velho professor as cans, a barba branca,
    Infundiam respeito, impunham sympathia,
    Modelando as feições do velho, que sorria
    E era como creança em meio das creanças.
    Como ao pombal correndo em bando as pombas mansas,
    Corriam para a escola; e nem sequer assomo
    De aversão ou desgosto, ao ir para ali como
    Quem vae para uma festa. Ao começar o estudo,
    Elles, sem um pesar, abandonavam tudo,
    E submissos, joviaes, nos bancos em fileiras,
    Iam todos sentar-se em frente das carteiras,
    Attenta, gravemente — uns pequeninos sabios.
    Uma phrase a animar aquelle bando imbelle,
    Ia ensinando a este, ia emendando áquelle,
    De manso, com carinho e paternal amor.
    Por fim, tudo mudou. Agora o professor,
    Um grave pedagogo, é austero e conciso;
    Nunca os labios lhe abriu a sombra d’um sorriso
    E aos pequenos mudou em calabouço a escola
    Pobres aves, sem dó metidas na gaiola!
    Lá dentro, hoje, o francez é lingua morta e muda:
    Unicamente o allemão ali se falla e estuda,
    São allemães o mestre, os livros e a lição;
    A Alsacia é allemã; o povo é alemão.
    Como na propria patria é triste ser proscripto!
    Frequentava tambem a escola um rapazito
    De severo perfil, energico, expressivo,
    Pallido, magro, o olhar intelligente e vivo
    — Mas de intima tristeza aquelle olhar velado
    Modesto no trajar, de lucto carregado...
    — Pela patria talvez! — Doze annos só teria.
    O mestre, d’uma vez, chamou-o á geographia:
    — "Dize-me cá, rapaz... Que é isso? estás de lucto?
    Quem te morreu?"
    — "Meu pae, no último reduto,
    Em defeza da patria!"
    — "Ah! sim, bem sei, adeante...
    Tu tens assim um ar de ser bom estudante.
    Quaes são as principaes nações da Europa? Vá!"
    — "As principaes nações são... a França..."
    — "Hein? que é lá?...
    Com que então, a primeira a França! Bom começo!
    De todas as nações, pateta, que eu conheço,
    Aquella que mais vale, a que domina o mundo,
    Nas grandes concepções e no saber profundo,
    Em riqueza e esplendor, nas lettras e nas artes,
    Que leva o seu domínio ás mais remotas partes,
    A mais nobre na paz, a mais forte na guerra,
    D’onde irradia a sciencia a illuminar a terra,
    A maior, a mais bella, a que das mais desdenha,
    Fica-o sabendo tu, rapaz, é a Allemanha!"
    Elle sorriu com ar desprezador e altivo,
    A cabeça agitou n’um gesto negativo,
    E tornou com voz firme:
    — "A França é a primeira!"
    O mestre, furioso, ergue-se da cadeira,
    Bate o pé, e uma praga energica lhe escapa.
    — "Sabes onde está a França? Aponta-m’a no mappa!"
    O alumno ergue-se então, os olhos fulgurantes,
    O rosto afogueado; e emquanto os estudantes
    Olham cheios de assombro aquelle destemido,
    Ante o mestre, nervoso, audaz e commovido,
    Timido feito heróe, pygmeu tornado athleta,
    Desaperta, febril, a sua blusa preta,
    E batendo no peito, impavida, a creança
    Exclama:
    — "É aqui dentro! aqui é que está a França!"
                                                                                   Acácio Antunes

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Nostalgia

Não pude deixar de sentir alguma nostalgia ao ver uma casa tão emblemática para o meu pai, e até para mim, ser destruida desta forma. Eu sei que tudo tem um fim e a vida é feita de renovações, mas...
Fica o "mas".

Demolição de casa antiga do Pancão perto da Igreja de São Sebastião em Almada

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

"Era noite, fria agreste...".
Era assim que começava aquele que desde sempre foi o trabalho do meu pai que estava no top das minhas preferências.
Quando iamos a uma casa de fados eu já sabia, do alto dos meus 6 anos, que a meio da sua actuação o "velho Max" (expressão carinhosa com que os amigos o tratavam) dirigia-se ao publico dedicando-me este poema em forma de sextilha, "O CÃO FIEL", de seu nome.
Muita pena tenho eu de já não ter este documento comigo, pois certamente o emolduraria, tal a beleza e a expressão com que o poeta contava a história comovente de um menino sem-abrigo que no meio de uma tempestade encontra um cachorrinho, esfomeado e enregelado, tal como ele, e se aconchegam os dois, aquecendo-se mutuamente, e alimentando-se de algumas migalhinhas de pão que iam sendo divididas irmanmente. Até que um dia um transeunte, passando já durante a bonança, encontra os dois cadáveres abraçados numa morte que tem tanto de horrivel como de ternurenta.

Não perdi a esperança de encontrar este documento. Assim Deus me ajude.